"As crônicas vampirescas: A história do ladrão de corpos" , pág 450/451


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"Encostei o ouvido no peito dele. Ouvi o grito estridente da ambulância em Georgetown. 'Não me deixe morrer'.
Eu o vi naquele hotel de sonho, há muito tempo, com Louis e com Claudia. Seremos todos criaturas sem importância nos sonhos do demônio?
O coração estava mais lento. Quase na hora. Mais um pequeno drinque, meu amigo.
Eu o ergui, beijei as pequenas marcas, lambi, chupei e cravei os dentes. Um espasmo estremeceu o corpo de David e um grito abafado saiu dos seus lábios.
- Eu o amo - murmurou ele.
- Sim, e eu o amo - respondi, as palavras abafadas, a boca junto à carne, enquanto o sangue jorrava quente e irresistível mais uma vez.
As batidas do coração ficaram mais lentas ainda. David despencava no meio de lembranças, voltando ao berço, muito além das sílabas distintas da linguagem, gemendo como quem murmura uma canção.
O corpo quente e pesado estava apertado contra o meu, os braços caídos, a cabeça apoiada na palma da minha mão esquerda, os olhos fechados. Os gemidos morreram nos seus lábios e o coração acelerou de repente com batidas rápidas e fracas.
Mordi minha língua até não suportar mais a dor, ferindo-a seguidamente com minhas presas, movendo-a de um lado para outro e, então, juntei minha boca à dele, obriguei os lábios a se abrirem e deixei o sangue fluir na sua língua.
O tempo parou. Senti o gosto do meu sangue na minha boca. Então, de repente, os dentes da Daivid se fecharam na minha língua, ameaçadores e cortantes com a força mortal das mandíbulas, e rasparam a carne sobrenatural, o sangue que a cobria, mordendo com tanta força que a teria arrancado se fosse possível.
Um espasmo violento percorreu o corpo dele. As costas se arquearam contra meu braço. E quando eu ergui a cabeça, com a boca e a língua doloridas, ele se ergueu, sedento olhos cegos ainda. Cravei os dentes no meu pulso. Aqui está, meu amado. Aqui está, não em pequenas gotas, mas saindo do rio da minha existência. E dessa vez, quando os lábios de David se fecharam no meu pulso, a dor intensa desceu até as raízes do meu ser, envolvendo meu coração em sua chama ardente.
Para você, David. Beba bastante. Seja forte.
[...] Ajoelhei no chão, com David nos meus braços, deixando que a dor se espalhasse, chegando a cada artéria, como eu sabia que tinha de ser. E o calor e a dor eram tão intensos que deitei no chão abraçado com David, meu pulso na sua boca, minha mão sob sua cabeça. Fiquei tonto. As batidas do meu coração estavam perigosamente lentas. David sugava e sugava e através das trevas cintilantes dos meus olhos fechados vi os milhares e milhares de pequenos vasos sendo esvaziados e contraindo e ficando flácidos como os fios de uma teia de aranha desfeitos pelo vento. [...]" (Anne Rice)

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